O livro de Apocalipse é por mérito e conteúdo o livro das visões, Apocalipse significa revelação, desvelamento. Isto é: Cristo tirou o véu das coisas ocultas e as revelou para João (Ap 1:19). É o livro que mais utiliza linguagem simbólica na bíblia, ainda é um livro profético, e por isso de difícil interpretação. No momento não nos importa muito as escolas de interpretação do livro, apenas nos deteremos ao tema exposto. Por ser o livro das visões Apocalipse começa com a visão de Cristo na glória. Quais verdades nos são mostradas no texto em questão acerca da visão de Cristo na glória? Veremos adiante.
Antes de prosseguir com a leitura, você pode também assistir a pregação na íntegra, em nosso canal no YouTube, no vídeo abaixo:
I. Cristo manifesta sua glória no sofrimento de seus santos
O peso da evidência literária parece mostrar que Apocalipse foi escrito nos dias do imperador Domiciano (81-96 d.C), também chamado de segundo Nero, em razão de sua perseguição aos cristãos. Apocalipse provavelmente foi escrito entre os anos 90 a 95 d. C, o que concorda com o contexto de perseguição do qual o livro trata. Principalmente sofreram muito as igrejas da Ásia menor. No verso 9 diz: “Eu João, irmão vosso e companheiro na aflição (outra versão diz: tribulação)…” A palavra grega para tribulação que João usou aqui é “thlipsis” significa pressão, aperto, indicando que a igreja estava sendo apertada, sendo esmagada pela perseguição.
Mas quando a igreja é pressionada pelas perseguições Cristo lhe manifesta a sua glória. Quando João estava exilado numa ilha escura e destinada aos “inimigos” do estado sofrendo talvez as piores privações, O Senhor Jesus Cristo lhe manifestou sua gloriosa luz libertadora.
Essa realidade lembra-nos dos três amigos de Daniel, laçados na fornalha ardente, mas com eles apareceu o glorioso quarto “homem” (Dn 3). Saulo perseguia ferozmente a igreja do Senhor, mas “subitamente o cercou um resplendor de luz do céu…” (At 9:3). Porque Cristo manifesta sua glória no sofrimento de sua igreja. Isso nos mostra duas verdades importantíssimas:
- Devemos enxergar as aflições como um meio pelo qual Deus manifesta sua glória em nós.
- É falsa e diabólica a famigerada teologia da prosperidade, a qual perverte o ensino bíblico verdadeiro sobre o sofrimento.
II. Cristo manifesta sua glória para nos convocar para uma missão.
No texto em questão, João diz “ouvi detrás de mim uma voz como de trombeta…” (Ap 1:10). Ezequiel também ouviu uma voz estrondosa quando viu a glória do Senhor (Ez 3:12). Ezequiel foi chamado para ser o Atalaia, isto é, o vigia da torre (Ez 3:16-26). Em tempos bem antigos, as cidades eram cercadas por altas e largas muralhas com torres, nessas torres se punha em guarda um vigia, que era encarregado de dar aviso para a cidade, se ele via algo vindo então ele tocava a trombeta então a cidade ficava em alerta. Nos dias da escrita do livro de Apocalipse, “A trombeta era usada para alertar os exércitos romanos, pondo-os em prontidão militar”
Quando João ouviu a “voz como de trombeta ele estava ciente de que Cristo estava convocando-o para uma missão especial, escrever para a sua igreja as sete cartas (Ap 1: 19).
O Cristo glorioso que João viu, tem uma missão para cada um de nós, cada crente é chamado a glorificar a Deus em sua vocação. Não importa a nossa função neste mundo, não importa o “tamanho” da nossa missão. Uma mão que amamenta, que cozinha, que lava, que passa, etc., glorifica tanto a Deus quanto um pregador do evangelho. Um lavrador do campo glorifica a Deus tanto quanto um executivo que detém e administra grandes riquezas, desde que ambos façam tudo para a glória de Deus (I Co 10: 31).
III. A Visão de Cristo na glória é a visão do cuidado que Ele do seu povo.
O Cristo glorioso se revela como cuidando de seus santos. No versículo 13: “Ele está no meio dos sete castiçais de ouro” e no versículo 20 nos é dito que “os sete castiçais são as sete igrejas”. E ainda no versículo 16, “Ele tinha na sua mão sete estrelas” as quais são os sete anjos (pastores) das igrejas (20).
Cristo cuida de sua igreja de duas formas:
- Está conosco todos os dias até a consumação dos séculos (Mt. 28:20).
- Cuida de sua igreja direcionando seu ministros, os ministros são representados pelas sete estrelas na sua mão, (16). Cristo intrui sua igreja, e lhe concede pastores segundo o seu coração. Mas devemos notar que pode acontecer, de haverem igrejas com membros fiéis, mas com pastores ruins, com lobos devoradores, (prova disso são os inúmeros casos de pastores liberais, homens que negam a veracidade da palavra de Deus, mas que lideram as igrejas de Deus). Pode ocorrer também de pastores fiéis lidarem com igrejas ruins. Aqui lembremos da igreja de Corinto que muito fez sofrer o apóstolo Paulo. Contudo essas realidades infelizes não anulam a promessa do Cristo glorioso de guardar sua igreja e estar sempre com ela.
IV. A Visão de Cristo na glória nos mostra sua divindade.
A divindade de Cristo é claramente evidenciada no NT. Se lemos atentamente os primeiros escritos do período pós-apostólico: Clemente de Roma, Didaquê, Inácio de Antioquia… os apologistas Justino, Atenágoras, Irineu, Tertuliano… é também evidente que todos eles ao lerem as escrituras sagradas entenderam a revelação que mostra claramente a divindade de Cristo.
O primeiro grande conflito da igreja envolvendo a questão da natureza divina do Senhor Jesus Cristo, foi travado no IV século, Ário (250 -336 d.C) um presbítero de Alexandria, começou a negar a eternidade do Filho junto ao Pai, depois de longos conflitos e debates intensos, finalmente a igreja se reuniu no primeiro concílio ecumênico em Nicéia em 325 d.C. Ali ficou definido que Cristo é “Homoousios” consubstancial com o Pai. Tempos depois a igreja também teve que definir os termos da consubstancialidade do Espírito Santo em Constantinopla 381 d.C. Sendo assim, desde o século IV, a igreja do Senhor tem defendido a doutrina da Santíssima Trindade, isto é: Deus é um em substância mas em três pessoas distintas. O Pai, o Filho e o Espírito Santo .
Esse Texto que lemos nos mostra claramente a divindade de Cristo, vejamos:
- Sua eternidade, no versículo 14 diz-nos que “seus cabelos eram brancos como a lã branca, como a neve…” Cristo é identificado com as mesmas características do Ancião de dias da visão de Daniel (Dn 7:9), essas características representam a eternidade, os inúmeros dias do Ancião. No versículo 17, Cristo diz ser: “o Primeiro e o Último”.
- O texto fala de sua majestade. No versículo 13 Cristo nos é mostrado em vestes reais, ou seja é o Rei dos reis e o Senhor dos senhores (Ap 19:16). Ele tem um cinto de ouro em seu peito. Ele é o Rei Eterno. Lembra-nos da visão de Daniel “das vestes brancas como a neve …” (Dn 7:9). Lembra-nos ainda de que a veste de Deus na visão de Isaías, bastava apenas a “aba das suas vestes para encher o templo” (Is 6:1).
- Cristo é divino porque é o juiz supremo. O texto nos mostra Cristo como o Juiz supremo, e só pode executar um juízo nesse nível, se for Deus, divino: a) Seus olhos são como chama de fogo (14). O fogo é o elemento que prova a excelência de qualquer material. Ver: (1 Pd 1: 7; 1 Co 3:12-15). Ainda seu juízo é perfeito porque sua palavra já foi anunciada, e é por ela que ele Julgará toda a humanidade; “da sua boca saía uma espada aguda de dois fios…”a palavra que tenho pregado, o julgará no último dia…” (Jo12:48), veja ainda Hb 4:12.
- Lembremo-nos da estátua do sonho de Nabucodonosor (Dn 2) ali os pés da estátua em parte eram de ferro e misturados com barro. Mas aqui João viu que os “Pés de Cristo eram semelhantes a “latão reluzente” ou “bronze polido, como refinados na fornalha…” (15). Para os destinatários essa era uma figura de linguagem conhecida, já que a região da Ásia menor era uma região onde era bem conhecida e praticada a profissão de ourives. Bem, a diferença da estátua do sonho de Nabucodonosor para a visão de Cristo, é que na visão do rei, a estátua ruiu por terra, quando “atacada nos pés de ferro e de barro…” (Dn 2:34). Mas os pés de Cristo é um material especial, já provado na fornalha, ou seja; seu juízo é supremo porque seu domínio é firme. Que o domínio de Cristo não tem fim é confirmado ainda por outra visão de Daniel no capítulo 7: 13-14: “Eu estava olhando nas minhas visões da noite, e eis que vinha nas nuvens do céu um como o filho do homem; e dirigiu-se ao ancião de dias, e o fizeram chegar até ele. E foi-lhe dado o domínio, e a honra, e o reino, para que todos os povos, nações e línguas o servissem; o seu domínio é um domínio eterno, que não passará, e o seu reino, o único que não será destruído.”.
Qual reino jamais será destruído? Só pode ser um reino divino, Cristo é o juiz supremo porque Ele é divino, Ele é Deus com o Pai e o Espírito Santo. Sim Ele é Deus, Ele é o juiz infalível, Justo e Verdadeiro.
V. A manifestação da glória de Cristo revela o mal do pecado e a graça do Senhor.
João foi levado para uma esfera sobrenatural (10), Cristo manifestou a ele sua glória. Cristo é Santo e sem nenhum pecado (Jo 8:46; Hb 4:15), mas João é pecador, como toda a raça humana ele nasceu contaminado em Adão (Sl 51:5; Rm 3:23; Rm 5:12). E Agora João está diante da manifestação da santa natureza do Verbo de Deus, João viu a glória de Cristo, João viu o que sua natureza caída não poderia suportar, nos versículos 13 ao 16, ele descreve a visão, mas no versículo 16, ele diz: “E, eu quando o vi, cai a seus pés como morto,…” João forçosamente foi ao chão, não porque quis, mas por necessidade, por causa da terrível manifestação da natureza santa e divina de Cristo, ele caiu por causa de seu pecado que não suportou a santidade de Cristo.
Faz-noz lembrar da vez em que Moisés se atreveu a orar a Deus querendo ver sua glória (Êx 33:18), mas que lhe deu em resposta o Senhor Deus? “Não poderás ver a minha face, porquanto homem nenhum verá a minha face e viverá.” (Êx 33:20). Lembra-nos do terror que suportou o profeta Isaías ao ver a glória de Deus: “Ai de mim, que vou perecendo!”. Ora, é impossível um ser humano na sua natureza pecaminosa contemplar a natureza santa de Deus e permanecer de pé. Simplesmente por causa do mal do pecado.
Mas, porque João não morreu ao contemplar a glória de Cristo? E a resposta é a graça. A maravilhosa graça de Cristo Jesus nosso Senhor (Ef 2:8; 1 Tm 1:14). É por causa da graça que somos salvos, somente por graça pela fé em Cristo.
Todos pecamos e merecedores somos da morte, assim como João caiu prostrado ante a santidade de Cristo, assim toda a natureza humana herdada de Adão, nós, caímos e morremos em nossos pecados, mas a graça de Cristo é abundante para nós. “veio porém a lei para que a ofensa abundasse, mas onde abundou o pecado superabundou a graça.” (Rm 5:20).
Essa é a maravilhosa razão por que o Verbo se fez carne (Jo 1:14), nunca humanamente falando entenderemos perfeitamente a encarnação, humilhação e glorificação da segunda pessoa da Trindade, nosso Senhor Jesus Cristo, sem nos vermos e sentirmos com extremamente malignos em nossos pecados. Mas ainda assim, nos rendemos ao seu santo amor gracioso, e confiamos nossa salvação ao Senhor Jesus Cristo Filho de Deus e Salvador por graça, apenas por graça. Foi por graça que Ele desceu e se esvaziou, se humilhou até a terrível e vergonhosa morte de cruz (Fp 2: 5-7).
João caiu prostrado, com a sensação terrível de que morreria exatamente ali naquele instante, mas o Senhor Jesus Cristo, todo-poderoso, misericordiosamente, por sua maravilhosa graça “Ele pôs sobre mim a sua destra, dizendo-me: não temas, eu sou o Primeiro e o Último”. Assim é o Senhor para conosco, Ele nos ver caídos em nossos terríveis pecados, manifesta-se para nós como Santo e perfeito, mas ao mesmo tempo nos vivifica da nossa morte (Ef 2:1).
Essa é a visão de Cristo na glória, e como os fatos na experiência de João se aplicam a nós.
A Deus sempre a glória. Amém.